sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Em tempo de peste

"Crucificação",  1428, obra de Tommaso Masaccio (1401-1428) 

A um crucifixo

Há mil anos, bom Cristo, ergueste os magros braços
E chamaste da cruz: há Deus! e olhaste, ó crente,
O horizonte futuro e viste, em tua mente,
Um alvor ideal banhar esses espaços!

Porque morreu sem eco o eco dos teus passos,
E de tua palavra (ó Verbo!) o som fremente?
Morreste… ah! dorme em paz! não volvas, que descrente
Arrojaras de novo à campa os membros lassos…

Agora, como então, na mesma terra erma,
A mesma humanidade é sempre a mesma enferma,
Sob o mesmo ermo céu, frio como um sudário…

E agora, como então, viras o Mundo exangue
E ouviras perguntar: -de que serviu o sangue
Com que regaste, ó Cristo, as urzes do Calvário?-

in Os Sonetos Completos de Anthero de Quental, publicados por J. P. Oliveira Martins, Livraria Portuense de Lopes & C.ª –Editores, Porto, 1890

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